Relator: Dr. Antonio Carlos Alves Cardoso
Doutor em Pediatria pela FMUSP; Membro do Núcleo de Estudos da Violência contra Crianças e Adolescentes da SPSP.
A sindrome de Münchausen por transferência (SMT) é uma modalidade de abuso infantil em que um dos pais ou responsável, em geral a mãe, recorrentemente falsifica sinais/sintomas físicos ou psicológicos em uma criança, com o objetivo da vitima ser considerada doente. Uma caracterização desta síndrome é ausência de incentivos externos para o comportamento (ganho econômico, fuga de responsabilidade legal ou melhora de bem-estar físico) diferenciando-a de simulação.
A incidência da síndrome é difícil avaliar devido à dificuldade diagnóstica. Nos EUA, do total de 3 milhões de casos de abusos reportados por ano, 5.000 são pela SMT sendo que 8-10% evoluem para o óbito. A idade varia de menos de 1 mês a 21 anos de idade, predominando em menores 5 anos, sendo a média 20 meses. Não há predomínio de sexo.
Embora a “fabricação” de sinais e sintomas persistam por longo tempo, o diagnóstico geralmente é difícil, necessitando uma equipe de saúde experiente, já que o agressor tem conhecimento de doenças. O tempo médio para o diagnóstico é de 3 a 6 meses e frequentemente em mais de uma internação. Os sinais e sintomas podem persistir, mesmo com a criança internada, em
O quadro clínico é dependente de uma das três formas de manifestação da agressão:
–Mentira, quando o agressor relata dados não verdadeiros, como, por exemplo, convulsão, vômitos, febre, alergias ou recusa a determinado leite ou medicamento, o que pode privar a criança de alimentos ou medicamentos dos quais necessita sem motivo real.
-Simulação, ocorre sem agressão direta à criança, como, por exemplo, aquecer o termômetro simulando febre, acrescentar sangue (geralmente do próprio agressor) à urina ou fezes para simular hemorragia, fraudar anotações de enfermagem ou resultados de exames. É estimado que em aproximadamente 25% das ocorrências da síndrome há esta forma de apresentação.
-Indução, neste caso os sintomas ou sinais aparecem de formas variadas como, por exemplo, uso de catárticos para provocar diarreia, atritar a pele para provocar erupções ou aquecer a criança para elevar sua temperatura, intoxicação (depressores de SNC, anticoagulantes, insulina etc), asfixia (com sacos plásticos, travesseiros, mãos, etc). É este o grupo de crianças com maior risco de morte ou sequelas graves. Estima-se que uma porcentagem dos óbitos por “morte súbita” na realidade foram vítimas desta síndrome. Em 50% dos casos há indução dos sinais/sintomas e, em 25%, coexistem simulação e indução.
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