Segunda chance

Segunda chance

Foi instituído no Brasil o Dia Nacional da Doação de Órgãos, celebrado no dia 27 de setembro. Uma ocasião para conscientização, reflexão e reconhecimento da importância desse ato de generosidade, que tem o poder de salvar vidas e proporcionar uma segunda chance a quem parecia não ter mais esperança alguma.

A doação de órgãos é um ato de altruísmo, solidariedade, de imensa generosidade. Transforma a vida de quem recebe um órgão e dignifica a memória de quem é doador e faz emergir, em meio ao sofrimento e dor dos que perderam um ente querido, aquela expressão mais nobre da alma humana – a compaixão. 

 Cada um de nós é um potencial doador, bem como um potencial receptor.

A intenção sobre a doação de órgãos deveria fazer parte dos assuntos discutidos em família – talvez não à mesa da macarronada do domingo, mas em outro momento oportuno. Nossos parentes só saberão das nossas intenções sobre esse tema se souberem o que pensamos sobre isso. No momento final da vida, poderemos não ter controle algum, sendo, então, nossos parentes que terão a possibilidade de tornar real a nossa vontade antecipada.

O Dia Nacional da Doação de Órgãos é uma oportunidade para celebrar não apenas as vidas salvas, mas também para agradecer a todos os profissionais de saúde, equipes de transplante e organizações envolvidas, cujos esforços incansáveis tornam possível a realização desses procedimentos complexos.

Um único doador tem o potencial de mudar a trajetória de várias vidas, oferendo várias segundas chances. Um único doador pode oferecer a oportunidade para que vários órgãos e partes do seu corpo continuem gerando vida, ou dando melhor qualidade de vida a outras pessoas. Um único doador pode salvar até dez vidas. A doação inclui córneas, rins, fígado, pulmões, coração, pâncreas, intestino, além de pele e ossos.

Além do impacto direto nos receptores, os transplantes também têm um efeito positivo no sistema de saúde como um todo. Ao reduzir a dependência de tratamentos prolongados e caros, os transplantes aliviam a pressão sobre os recursos médicos, permitindo que mais receitas sejam disponibilizadas para outras áreas de cuidados de saúde. Isso cria um ciclo virtuoso em que a doação de órgãos não apenas salva vidas, mas também aprimora a eficiência dos sistemas de saúde.

O Brasil é o segundo país do mundo que mais realiza transplantes, atrás apenas dos Estados Unidos. O nosso país tem o maior sistema público (gratuito) para transplantes de órgãos do mundo. Hoje, o Brasil conta com mais de 600 hospitais autorizados para a realização de transplantes. De acordo com o Ministério da Saúde, em 2021, foram feitos cerca de 23,5 mil procedimentos. Desse total, cerca de 4,8 mil foram transplantes de rim, 2 mil de fígado, 334 de coração e 84 de pulmão, entre outros.

O modelo brasileiro de transplantes de órgãos foi inspirado no modelo da Espanha – que é referência por sua eficiência no mundo. A versão brasileira foi criada em 1997 e começou a ser regulamentada pela Lei 9.434 de 1997 (esta é a lei que, inclusive, proíbe a venda de órgãos no país).  “A retirada de tecidos, órgãos e partes do corpo de pessoas falecidas para transplantes ou outra finalidade terapêutica, dependerá da autorização do cônjuge ou parente, maior de idade, obedecida a linha sucessória, reta ou colateral, até o segundo grau inclusive, firmada em documento subscrito por duas testemunhas presentes à verificação da morte”, afirma a lei ajustada (em 2001) e até hoje em vigor.

Os órgãos doados vão para pacientes que necessitam de transplante e estão aguardando em uma lista de espera única, organizada por estado ou região, e monitorada pelo Sistema Nacional de Transplantes (SNT).

Apesar do bem estabelecido sistema brasileiro para doações de órgãos, através do SUS, um dos problemas ainda é a falta de doadores, já que muitas famílias não se sentem confortáveis em autorizar a doação, por razões diversas: daí o diálogo permanente para esclarecimentos e as campanhas de conscientização serem indispensáveis.

Entre a morte de um paciente e o transplante de um coração, por exemplo, o tempo de isquemia (período limite de sobrevivência do órgão fora do corpo) é de apenas 4 horas. É necessário que hospitais e equipes multiprofissionais sejam capacitadas para agir no momento da captação de órgãos.

Por causa dessas questões, no Brasil, são estimados 13,8 doadores efetivos para cada 1 milhão de habitantes. Em alguns países, este número é mais que o triplo. Por exemplo, este índice chega a ser de 41,6 nos EUA e 40,8 na Espanha. A recusa familiar é o principal motivo que impede a doação de órgãos no Brasil, de acordo com uma pesquisa conduzida pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Em 2022, mais de 45% das famílias não concordaram com a doação. Atualmente, mais de 59 mil pessoas estão na fila esperando por um órgão.

Os transplantes realizados entre pessoas vivas são possíveis desde que sejam de órgãos duplos e que haja possibilidade do doador ter uma vida com saúde normal após o transplante. Um dos rins ou pulmões, parte do fígado, do pâncreas e da medula óssea são exemplos de órgãos que podem ser doados ainda em vida. Pessoas em boas condições de saúde, capazes juridicamente e que concordem com a doação podem ser consideradas aptas a doar em vida. Por lei, pais, irmãos, filhos, avós, tios e primos podem ser doadores. A doação por pessoas que não são parentes pode acontecer somente com autorização judicial.

Saiba mais:

Relatório de Transplantes Realizados (Brasil) – Evolução 2001 – 2021 – Sistema Nacional de Transplantes (SNT). Ministério da Saúde (MS): https://www.gov.br/saude/pt-br/composicao/saes/snt/estatisticas/transplantes-serie-historica/transplantes-realizados/relatorio-de-transplantes-realizados-brasil-evolucao-2001-2021/view

Relator:

Fernando MF Oliveira

Coordenador do Blog Pediatra Orienta da SPSP