Riscos da gravidez precoce para a adolescente e seu filho

Riscos da gravidez precoce para a adolescente e seu filho

A Semana Nacional de Prevenção da Gravidez na Adolescência acontece de 1 a 8 de fevereiro. A gravidez na adolescência é um fenômeno global que possui causas muito bem conhecidas, assim como consequências sociais, econômicas e para a saúde. Tende a ser maior entre aquelas de menor grau de escolaridade ou menor status econômico e, embora se verifique diminuição na taxa da primeira gravidez, essa ainda se mantém muito alta no Brasil, se comparada a países desenvolvidos.

Segundo o Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA), ao considerar meninas entre 10 e 19 anos, o Brasil é um dos países da América Latina com a maior prevalência de gravidez na adolescência (14%), ficando atrás do Paraguai (15%), Equador e Colômbia, ambos com 18%.

A denominação mais adequada é GRAVIDEZ PRECOCE, pois acontece em uma fase da vida da mulher na qual seu organismo está num período de intensas mudanças físicas, psíquicas e sociais, e para que se desenvolva plenamente, tais mudanças precisam acontecer com o menor número possível de intercorrências – e uma gravidez é uma grande intercorrência no desenvolvimento.

Estudos recentes demonstram que a gravidez em uma mulher adulta acarreta mudanças no cérebro semelhantes às que ocorrem na adolescência. Resumidamente, há uma diminuição da substância cinzenta, entre outras alterações significativas, possivelmente mediada pelos hormônios da gravidez. Adolescentes já estão naturalmente passando por mudanças relevantes no cérebro, iniciadas na puberdade e que se estendem até 20 anos ou mais. Neste sentido, gestantes adolescentes têm uma sobreposição de estímulos hormonais no cérebro.

Figura 1. Alterações no cérebro durante a adolescência

A massa cinzenta se reduz e a massa branca aumenta, fazendo com que as conexões cerebrais sejam mais específicas e mais rápidas. Essas alterações se iniciam no início da puberdade na região posterior do cérebro (occipital) e progridem para a região frontal (região mais elaborada do cérebro).

 

Figura 2. Alterações que ocorrem no cérebro de gestantes adultas, mostrando que a substância cinzenta também diminui

Carmona et al. A comparative analysis of cerebral morphometric changes. Hum Brain Mapp. 2019 May;40(7):2143-2152

 

Riscos intrauterinos para filhos de mães adolescentes 

É possível inferir que essa sobreposição de alterações no cérebro da mãe adolescente (i.e., alterações do cérebro adolescente somadas às alterações do cérebro materno), acrescida de pressões sociais e familiares, bem como as incertezas em relação ao futuro, podem gerar um estresse muito intenso (e tóxico), afetando de forma significativa o cérebro da adolescente e do feto.

Quando a mãe está sob estresse, seu corpo libera hormônios como o cortisol e a adrenalina. Esses hormônios podem atravessar a placenta e afetar o desenvolvimento do cérebro do feto, interferindo na formação de sinapses, que são as conexões entre os neurônios. Essas alterações podem impactar a comunicação neuronal e, consequentemente, o desenvolvimento cognitivo e emocional da criança.

Crianças expostas a altos níveis de estresse intrauterino podem ter maior risco de desenvolver problemas emocionais e comportamentais, como ansiedade e dificuldades de atenção à medida que crescem. E podem apresentar um aumento da vulnerabilidade a transtornos mentais na adolescência e na idade adulta.*

Para a gestante adolescente os riscos são amplos

As adolescentes já estão naturalmente em uma fase de crescimento e desenvolvimento e a gravidez precoce pode interferir nesse processo. Elas podem enfrentar complicações como hipertensão gestacional, anemia e pré-eclâmpsia, entre outras complicações relevantes.

  1. A gravidez em adolescentes está associada a um maior risco de parto prematuro, o que pode levar a complicações para o bebê, como baixo peso ao nascer e problemas de saúde a longo prazo.
  2. As adolescentes podem ter uma taxa mais alta de abortos espontâneos, especialmente se não receberem cuidados pré-natais adequados.
  3. Muitas adolescentes podem não ter uma nutrição adequada durante a gravidez, o que pode impactar tanto a saúde da mãe quanto a do bebê. Uma alimentação inadequada pode resultar em deficiências nutricionais que afetam o desenvolvimento fetal. Para a adolescente há risco de uma menor aquisição de massa óssea, o que aumenta o risco de osteoporose na pós-menopausa.
  4. A gravidez na adolescência, além de limitar o desenvolvimento social da adolescente, pode causar estresse, ansiedade e depressão. A pressão social e as mudanças na vida podem ser difíceis de lidar, resultando em problemas de saúde mental.
  5. Muitas mães adolescentes enfrentam dificuldades financeiras, falta de apoio familiar e estigmas sociais, o que pode impactar ainda mais a sua saúde e bem-estar da mãe e do bebê.
  6. A gravidez pode interromper os estudos e limitar as oportunidades de carreira da adolescente, afetando seu futuro econômico e social.
  7. Mães adolescentes têm maior chance de trabalhar do que adolescentes não grávidas; entretanto, em sua maioria são empregos informais. E se comparadas a mulheres que tiveram filhos após os 20 anos, recebem 28% menos de salário.
  8. A gravidez na adolescência pode levar ao isolamento social, com a jovem mãe se afastando de amigos e atividades sociais, o que pode aumentar a sensação de solidão e depressão.

Os pais, professores e os pediatras devem fornecer informações corretas sobre sexualidade e prevenção da gravidez precoce. Falar sobre sexualidade, prevenção de gravidez e de infecções sexualmente transmissíveis não induz adolescentes a iniciarem a vida sexual mais precocemente!

Pediatras têm papel fundamental nessa prevenção: têm a capacidade de atuar na diminuição da primeira gestação precoce. Precisam orientar tanto a família quanto os adolescentes sobre métodos contraceptivos e prescrevê-los quando indicado.

A prevenção não se restringe às adolescentes: todos os adolescentes sempre devem participar dessas orientações.

As gestantes adolescentes devem ser informadas sobre seus direitos referentes aos estudos e devem ser encorajadas e apoiadas a continuar estudando.

Saiba mais:

* Prenatal developmental origins of behavior and mental health: the influence of maternal stress in pregnancy. The influence of maternal stress in pregnancy. Neuroscience and Biobehavioral Reviews. 2020;117:26-64.

Relatora:
Elizete Prescinotti Andrade
Presidente do Departamento Científico de Adolescência da Sociedade de Pediatria de São Paulo