Alguns países, confiando em dados encorajadores, embora escassos, começaram em abril a reabrir as escolas: a Dinamarca foi o primeiro, a partir do dia 15, seguida de outros países europeus, Austrália e Canadá ainda em maio.
Na China, a abertura das escolas aconteceu quatro meses após o fechamento, começou pelos estudantes de ensino médio e depois se estendeu ao ensino infantil, fundamental e até superior.
Na França, uma semana após recomeçarem as aulas de forma gradual, começando pelas pré-escolas, ensino fundamental e depois ensino médio, 70 escolas precisaram ser novamente fechadas, devido ao surgimento de novos casos, envolvendo seus membros. Na Coreia do Sul, a volta às aulas começou pelo último ano do ensino médio (com alunos que farão vestibular este ano) e para os outros de forma gradual nas semanas seguintes, porém, poucos dias após a abertura, 200 instituições precisaram ser fechadas por terem surgido mais casos e mais medidas restritivas foram adotadas.
Em alguns destes países existe a norma de que, caso haja um caso confirmado na escola, o aluno infectado ficará afastado da instituição por até três dias após o desaparecimento dos sintomas e a turma dele ficará afastada 10 dias no total.
Mas o que está claro é que a volta às aulas deve ser gradual em cada país e demanda planejamento, que passa por duas questões importantes: priorizar os mais novos (para os pais voltarem ao trabalho) e os jovens do ensino médio (por conta dos processos seletivos).
Em 10 de julho, o governo de Hong Kong ordenou o fechamento de todas as escolas a partir de 13/07, antecipando o início das férias de verão, por um “aumento exponencial” de casos locais de COVID-19.
Recomendações importantes
• Desinfecção de escolas: com medidas extras de limpeza, desinfecção antes e durante a permanência dos alunos, incluindo superfícies e equipamentos. Há até a recomendação (impossível!) de uso restrito de instalações sanitárias.
• Uso de máscaras: varia para cada país; na China, as crianças utilizam o tempo todo; em Israel, as crianças da 4ª série em diante têm que usar; enquanto na França, as crianças menores foram dispensadas do uso. A exceção é a Dinamarca, onde não se usa máscara em ambientes públicos. Lembrar que dispositivos tipo Face Shield são ineficazes em tempo de exposição moderado a longo.
• Controle de temperatura: na China e na Coreia do Sul, os estudantes passam por checagem sistemática da temperatura corporal. Em Pequim, pulseiras inteligentes estão sendo testadas, para aferição em tempo real. Os pais monitoram por meio de aplicativo e, se a temperatura ultrapassar 37ºC, um alerta é enviado para os professores, que são orientados a comunicar a polícia.Cuidado deve ser tomado para evitar a discriminação dos alunos.
• Horários diferentes de entrada e saída: Portugal, Finlândia e Israel organizaram os alunos em grupos, para terem horários de aula, intervalos, períodos de alimentação, entrada e saída diferentes entre si. Na Dinamarca, além do citado acima, diferentes portões são utilizados para que a entrada e saída dos grupos não coincidam. E o fluxo de alunos na escola deverá, se possível, ser contínuo.
• Higienização das mãos: a lavagem das mãos é exigida em todos os países, em alguns a cada duas horas. Além disso, adotaram outras medidas, como: disponibilização de álcool em gel nas entradas, de antissépticos e desinfetantes, EPIs, sabonete líquido, toalhas de mão nos banheiros e máscaras cirúrgicas.
• Grupos menores de alunos: alguns países, como Finlândia e Dinamarca, adotaram esta medida e as escolas de Seul poderão receber apenas um aluno a cada três, os demais terão que seguir com o ensino a distância.
• Distanciamento: em geral, as salas de aula foram reorganizadas de maneira que as mesas dos alunos tenham pelo menos um metro de distância entre si (França e Dinamarca). Em Israel essa distância é de dois metros e na Dinamarca o professor deve ficar a dois metros do estudante que senta mais próximo dele. Na Coreia do Sul foram instaladas paredes acrílicas entre os estudantes e destes com os professores. Outras medidas são: fazer marcações no chão, cantinas e refeitórios fechados, almoço e merenda dentro da sala de aula com comida embalada.
• Arejar as salas: manter as janelas abertas antes das aulas, durante o intervalo, depois da saída dos alunos e, quando possível, fazer as aulas em locais abertos e ambientes com ventilação natural.
• Afastar professores do grupo de risco: em Israel, professores com mais de 65 anos não retomaram as atividades.
• Tendas de desinfecção na entrada: instaladas na China.
• Ensino híbrido: com aulas presenciais e online alternadas para todos os estudantes.
• Proibições: da entrada dos pais na escola, de reuniões de professores, de excursões e competições, de brinquedos trazidos de casa, do compartilhamento de objetos e de lanches.
E temos que pensar que:
• Vai ser muito difícil que crianças entre dois e cinco anos mantenham as máscaras em seu rosto o dia todo. Provavelmente vão removê-las, trocar de máscara com os coleguinhas, descobrir o nariz, tocar no rosto, mudar a máscara de posição e se contaminar neste processo.
• Embora relativamente poupadas nesta pandemia, as crianças são possíveis vetores de disseminação para outras crianças e adultos, além de a propensão de colocar coisas na boca poder aumentar muito o risco de propagação da doença.
• O papel das crianças na pandemia ainda é desconhecido, mas as creches e escolas precisam considerar as necessidades dos pais que dependem dos cuidados infantis para poder trabalhar.
• O risco que correm os funcionários destas instituições? Ainda é desconhecido, mas a situação financeira deles não pode ser esquecida!
• O Centro de Controle e Prevenção de Doenças norte-americano publicou orientações em abril. Entre elas vale ressaltar: medir a temperatura das crianças todos os dias após a chegada (provavelmente enquanto os funcionários estão usando EPI), não usar brinquedos que não possam ser higienizados e maiores de dois anos devem usar máscara de pano. Algumas medidas são impossíveis de serem adotadas, como troca de luvas para medir a temperatura de cada criança na entrada.
• Como garantir que os cuidadores de crianças pequenas lavem os braços e mãos e troquem de roupa a cada vez que manipularem uma criança e tomarem uma cusparada, “babada”, tossida, espirrada, etc?
Decidindo sobre a reabertura
Segundo o “Vozes da Educação”, antes de tomar a decisão de reabrir as escolas, governos e gestores escolares, em conjunto, devem avaliar algumas questões essenciais, como:
- O ensino presencial é essencial para aquela comunidade?
- Qual a disponibilidade e acessibilidade de ferramentas de qualidade de ensino a distância naquela comunidade?
- Por quanto tempo o ensino a distância será sustentável?
- Professores e demais profissionais da educação estão preparados para voltar a trabalhar presencialmente, acatando regras sanitárias, administrativas e pedagógicas?
- O fechamento das escolas aumentou a vulnerabilidade de alguns estudantes sofrerem violência doméstica e sexual?
- O fechamento das escolas comprometeu o fornecimento de serviços como saúde e alimentação?
- Como está o cenário de contaminação da região em que se localiza a escola?
- As escolas possuem capacidade (financeira, administrativa, logística) de adotar e manter as medidas de segurança necessárias para o combate ao vírus, como distanciamento social e reforço nos hábitos de higiene?
Essas análises podem ajudar os governos e os gestores a determinar quais devem reabrir, quais séries devem retornar primeiro e/ou se vai haver aulas todos os dias, por exemplo.
Aqui no Brasil, a necessidade de repensar a vida escolar a partir de agora deveria estar ancorada em várias questões:
• As imensasdesigualdades sociais e de educação que vivemos muito antes da eclosão desta pandemia.
• As funções da escola, de prover a única refeição decente diária de muitas crianças. Lembramos que para uma parcela significativa dos alunos a refeição na escola é a maior fonte de calorias e nutrientes.
• Alunos mais desfavorecidos são mais afetados: em casa sem acesso a computador, Internet e local para estudar, além da falta de saneamento básico e água encanada.
• Será que a escola está proporcionando a educação a distância (EAD) ideal para TODOS os alunos? O aprendizado está adequado? E na retomada, como será a avaliação do conteúdo passado durante a quarentena?
• A ONG “Todos Pela Educação” tem feito debates para discutir a volta às aulas, sendo consenso geral que é preciso escutar os professores.
• A questão dos alunos com necessidades especiais: segundo o Instituto Rodrigo Mendes, aulas em vídeo na Internet são o caminho certo para a exclusão e neste modelo de ensino precisa-se identificar as barreiras para o aprendizado, promover acessibilidade, garantir a segurança e máscaras transparentes para os intérpretes de Libras.
Este momento pode ser aproveitado para a implantação da Educação em Saúde, como tema transversal no currículo, mas que raramente é abordado em sala de aula como deveria ser feito. Um caminho seria a aproximação de pediatras e profissionais da área da saúde com os pais e as equipes escolares.
Cabe a todos nós contribuir para que a retomada ocorra em segurança e que as escolas envolvam seus protagonistas principais: professores, alunos e suas famílias. Nesta situação na qual não se sabe quase nada a respeito deste vírus e seus riscos, vai ser muito difícil – mas não impossível – decidir sobre as melhores práticas para as instituições de educação.
Leia mais:
1- Vozes da Educação. Educação e coronavírus. Reabertura das Escolas. Parte 1. Disponível em: https://www.institutounibanco.org.br/wp-content/uploads/2020/05/Reabertura-das-escolas-Parte-1.pdf
2- Todos pela Educação. Nota técnica: o retorno às aulas presenciais no contexto da pandemia da COVID-19. Maio 2020. Disponível em: https://www.todospelaeducacao.org.br/_uploads/_posts/433.pdf?119411076
3- Instituto Rodrigo Mendes. Protocolos para educação inclusiva durante a pandemia da COVID-19. Um sobrevoo por 23 países e organismos internacionais. Disponível em: https://institutorodrigomendes.org.br/wp-content/uploads/2020/07/protocolos-educacao-inclusiva-durante-pandemia.pdf
4- Graziela Balardim. Retomada das aulas no mundo: veja as medidas que estão sendo tomadas pelas escolas que já reabriram em outros países. Disponível em: https://www.clipescola.com/retomada-das-aulas-no-mundo/
___
Relatores:
Renata D. Waksman
Vice-presidente da Sociedade de Pediatria de São Paulo
Departamento de Segurança da Sociedade de Pediatria de São Paulo
Fausto Flor Carvalho
Departamento de Saúde Escolar da Sociedade de Pediatria de São Paulo