Relatoras:
Dra. Simone Brasil de Oliveira Iglesias
Mestre em Pediatria e Ciências Aplicadas à Pediatria pela EPM/Unifesp, Coordenadora da Disciplina de Bioética – Programa de Pós-graduação do Departamento de Pediatria da EPM/Unifesp, membro do Comitê de Ética em Pesquisa da UNIFESP e Secretária do Depto. Científico de Bioética da SPSP.
Dr. Mário Roberto Hirschheimer
Membro da Câmara Técnica de Pediatria do CREMESP, 1°Vice-presidente as SPSP e Presidente Departamento Científico de Bioética da SPSP.
A admissão de parturientes adolescentes drogaditas nas unidades materno-infantis traz conflitos quanto à responsabilidade pelo seu recém-nascido (RN) e pela própria mãe adolescente. A exposição pré-natal a drogas pode implicar em prejuízo no desenvolvimento do concepto, comprometendo-o física, intelectual e emocionalmente. Portanto, ambos podem ser considerados em situação de vulnerabilidade.
Como garantir segurança a esse RN após a alta? Pais drogaditos têm autonomia em relação aos seus filhos? A notificação dessa situação fere o princípio ético do sigilo?
Esses dilemas trazem à reflexão as referências bioéticas de beneficência, autonomia e justiça e como conduzi-las frente aos melhores interesses da criança.
Considerando que o Código de Ética Médica de 2009, nos seus artigos 73 e 74, veda ao médico revelar fato de que tenha conhecimento no exercício de sua profissão, salvo por motivo justo ou dever legal, mesmo se relacionado a menor de idade, inclusive a seus pais ou representantes legais, desde que ele tenha capacidade de discernimento, salvo quando sua não revelação possa acarretar dano ao paciente, ponderamos:
· Segundo o Artigo 227 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, o RN possui personalidade civil e é sujeito de direitos referentes ao dever da família, da sociedade e do Estado deassegurar-lhe o direito à saúde, colocando-o a salvo de toda forma de negligência e violência. Quando exposto às drogas na vida intra-uterina, ele pode ser considerado vítima de violência por negligência, mesmo que não intencional e não consciente.
· Como, de acordo com o Artigo 4° do Código Civil de 2002, drogaditos (mesmo os maiores de idade) e adolescentes são relativamente incapazes de exercer atos da vida civil e os Artigos 13 e 245 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) determinam o dever legal de comunicar ao Conselho Tutelar ou à Vara da Infância e da Juventude da situação de vulnerabilidade deste RN e de sua mãe adolescente, objetivando o benefício de ambos, esta notificação não pode ser considerada quebra de sigilo.
· A situação de RN filho de mãe drogadita deve ser submetida a processo de perda ou suspensão do poder familiar por parte dela na Vara da Infância e Juventude da região de sua moradia, de acordocom o Artigo 24 do ECA.
· Por decisão judicial, se o genitor (pai) for conhecido, maior de idade e capaz, ele pode ser considerado responsável pela guarda de seu filho, assim como os pais ou responsáveis de adolescentes drogaditos podem ser considerados responsáveis pela guarda de seu neto. Na falta deles, a Justiça da Infância e Juventude deve nomear um tutor.
Texto original publicado no Boletim Pediatra Informe-se Ano XXVII * Número 157 * Maio/Junho de 2011.