A Organização Mundial da Saúde (OMS) instituiu 4 de março como o Dia Mundial da Obesidade, com o objetivo de disseminar conhecimentos sobre a doença. Nas últimas décadas, a obesidade tem sido motivo de grandes discussões em todas as áreas do conhecimento.
Independentemente de se considerar o desenvolvimento de uma região ou país, a prevalência da obesidade vem aumentando de forma alarmante no mundo todo. Essa tendência reflete a maior disponibilidade de energia nos alimentos, ao lado da inatividade física crescente do homem moderno. Para mudar o rumo dessa epidemia é necessário que as estratégias de prevenção sejam aplicadas, reavaliadas e renovadas de forma constante. Projetos que incluam mudanças na qualidade do preparo e ingestão dos alimentos, estímulo à atividade física, e modificações comportamentais devem obrigatoriamente contar com a participação de toda a família, principalmente quando o indivíduo-alvo for uma criança ou um adolescente.
A criança obesa tem grande probabilidade de se tornar um adolescente e, posteriormente, um adulto obeso. A atitude intempestiva de redução drástica da ingestão de energia pode comprometer o seu crescimento e desenvolvimento. Dessa forma, a atenção multidisciplinar faz-se necessária para que a intervenção possa ocorrer sem riscos desnecessários, principalmente nos indivíduos onde o fator genético está presente, favorecendo a maior suscetibilidade à obesidade.
A prevenção tem custo social imenso e implica o gasto progressivo com a saúde, à medida que a obesidade regrida com o progredir da idade, pois as comorbidades que acompanham sua evolução tornam-se irreversíveis e muitas vezes fatais.
Prevenção
O pediatra é profissional de saúde responsável pela orientação para se atingir o melhor crescimento e desenvolvimento, desde o nascimento até atingir a idade adulta. Deve vigiar o crescimento, fazer o diagnóstico nutricional e implementar medidas preventivas e terapêuticas quando necessárias. Ainda mais, o pediatra deve coordenar o atendimento efetuado pelos outros profissionais da equipe multidisciplinar envolvidos no tratamento. Junto à família, deve trabalhar na conscientização do diagnóstico e complicações da obesidade, orientando tanto na prevenção como na estratégia do tratamento.
Embora o fator genético, combinado com a programação intrauterina, possa influenciar, de maneira independente da atuação do médico na evolução do indivíduo para o excesso de peso, os aspectos ambientais, os hábitos alimentares, o estilo de vida e a prática de atividade física precisam ser considerados pela família e pela criança ou adolescente, como os grandes fatores a serem analisados em conjunto, para poder modificá-los. Esse envolvimento familiar, ao lado da escola e comunidade, deve fazer parte dos pilares de qualquer programa preventivo da obesidade infantil.
Sugestões práticas são inúmeras, e podem ser propostas conforme a idade da criança e características do meio em que vive, seja a casa, a escola ou a comunidade.
O pediatra pode ainda ter outro tipo de atuação, por exemplo, quando for chamado a participar de decisões relativas ao uso de recursos públicos destinados a programas de prevenção de doenças, educação da saúde e racionalização do uso de novas tecnologias. Nessas situações, o seu papel será o de assumir a orientação científica que possa contribuir para o sucesso das ações conjuntas propostas pela mídia, indústria e órgãos governamentais.
No quadro abaixo estão sugestões que poderão ser avaliadas e discutidas nas diversas áreas envolvidas com a prevenção da obesidade infantil. Cada um dos módulos é acompanhado por muitas controvérsias, até aspectos que muitas vezes são aparentemente intocáveis, como é o caso do fator de proteção que o aleitamento materno representaria contra a obesidade infantil. Existem estudos que mostram que a amamentação indisciplinada do leite materno por mães extremamente ansiosas pode ser um fator de desequilíbrio entre oferta e necessidade nutricional, levando à obesidade da criança.
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– GRAVIDEZ – |
Iniciar a gravidez com IMC normal |
Não fumar |
Fazer atividade física moderada e tolerável |
Ficar atenta ao diabetes gestacional |
– PÓS-PARTO E INFÂNCIA |
Aleitamento materno exclusivo no mínimo por 3 meses e idealmente por 6 meses |
Retardar a introdução de alimentos sólidos e líquidos doces |
FAMÍLIAS |
Não insistir, não agradar e não forçar a comer. A consequência será sempre a substituição inadequada. |
Dar sempre preferência às grandes refeições, e não aos lanches |
Fazer refeições em horários e locais fixos |
Não “pular refeições”, especialmente o café da manhã |
Oferecer frutas, fibras e evitar sucos na mamadeira |
Evitar a TV ou celular durante as refeições |
Usar pratos pequenos e travessas pequenas |
Evitar molhos, alimentos gordurosos e refrigerantes |
Educar quanto ao uso de TV e celular |
Vocês são os modelos para os seus filhos (pais e familiares) |
ESCOLAS |
Eliminar lanches com balas e salgadinhos |
Evitar máquinas de alimentos |
Ensinar a professores e responsáveis a relação entre nutrição e atividade física |
Ter sempre água à disposição |
Bons hábitos devem ser sempre ensinados em todas as idades |
Aulas de Educação Física – 30 a 45 minutos de exercícios fortes 2 a 3 vezes por semana |
Ir a pé para a escola |
COMUNIDADES |
Vizinhos e amigos devem andar juntos e patrocinar brincadeiras para as crianças |
Evitar elevadores e vias fáceis para locomoção |
Sempre estar informado sobre onde se compram alimentos saudáveis |
BABÁS |
Elas precisam saber o que é e o que acontece com a obesidade |
Participar com ela do ganho de peso adequado da criança |
Apresentar a obesidade, mostrando que é uma doença a ser tratada |
INDÚSTRIA |
Produtos dirigidos a crianças precisam ter rótulos com informações |
Fabricantes de vídeos devem lançar frases que encorajem a atividade física |
Consumir alimentos saudáveis e subsidiar programas que incentivem estilo de vida saudável |
GOVERNO E ÓRGÃOS REGULADORES |
Explicar que obesidade é doença |
Taxar comidas e bebidas não saudáveis |
Incentivar o desenvolvimento de produtos saudáveis, com informações a esse respeito para o consumidor |
Deduzir impostos dos custos de programas saudáveis |
Fornecer incentivos para escolas que promovam programas relacionados com atividade física e nutrição |
Verbas para construção de ciclovias e pistas para corrida e caminhada |
Anúncios de advertência quanto aos tipos de alimentos, tanto para a pré-escola quanto para os mais velhos |
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Analisando cada um desses módulos, percebe-se que a prevenção da obesidade tem na disciplina e no estilo de vida saudável, quando exercida por uma família disposta a participar, as principais variáveis a serem consideradas.
A escola, os professores e a comunidade, sempre que possível, devem participar dos processos que envolvem medidas positivas em relação ao enfrentamento da epidemia da obesidade infantil.
Embora a tecnologia tenha criado inúmeros entraves para os movimentos das crianças nos últimos anos, tornando as exigências para exercícios cada vez menores, novas brincadeiras e novos métodos precisam ser criados, com mais atividades físicas em escolas e comunidades. Isso implica decisões familiares que obrigatoriamente estarão dirigidas para o estabelecimento de regras mais bem definidas na educação, especialmente nos limites permitidos.
Relator:
Ary Lopes Cardoso
Departamento Científico de Nutrição da Sociedade de Pediatria de São Paulo