No dia 5 de dezembro comemora-se o Dia Nacional da Acessibilidade. E qual a relação da acessibilidade com o cuidado? Para que acessibilidade?
Acessar é um verbo que pressupõe movimento e exige um impulso sensorial. No dicionário, “acesso” pode se referir à entrada, ao ingresso ou à possibilidade de chegar a algum lugar. Em um sentido mais abstrato, também pode indicar formas de comunicação. Independentemente da definição, acessar implica uma interação entre o indivíduo e o ambiente. Mas o que acontece quando o ambiente não está preparado para a forma como alguém pode interagir com ele? Será que todos experimentamos o mundo da mesma maneira? Temos todos o mesmo tipo de acesso?
A resposta, infelizmente, é não. E é aqui que a acessibilidade se torna crucial. Acessibilidade é um direito humano fundamental, como consagrado na Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência da ONU. Ela garante o direito à livre circulação, à saúde, ao lazer, ao trabalho, ao estudo e à participação plena na sociedade. No entanto, para que esses direitos sejam de fato universais, precisamos de ambientes que considerem a diversidade humana e ofereçam diferentes possibilidades de interação.
Embora a acessibilidade seja frequentemente associada às pessoas com deficiência – que representam mais de um bilhão de indivíduos em todo o mundo, segundo a Organização Mundial da Saúde – ela beneficia uma gama muito mais ampla de pessoas: crianças, idosos, gestantes, pessoas com mobilidade reduzida temporária, indivíduos com características físicas ou sensoriais específicas, e até mesmo aqueles que enfrentam barreiras linguísticas ou culturais também necessitam de ambientes e serviços acessíveis. Afinal, todos têm suas particularidades e podem, em algum momento da vida, precisar de soluções que facilitem sua interação com o mundo.
A ausência de acessibilidade priva não apenas as pessoas com deficiência, mas qualquer indivíduo que não se enquadre no modelo-padrão para o qual os ambientes e serviços geralmente são projetados. Isso perpetua barreiras sociais e físicas, agravando desigualdades e alimentando formas de preconceito estrutural, como o capacitismo. Esse preconceito, embora inicialmente voltado à discriminação contra pessoas com deficiência, pode ser ampliado para qualquer situação em que a sociedade falha em reconhecer e atender às necessidades de diferentes grupos.
Não existe um manual único para tornar o mundo acessível, e isso é compreensível. A dificuldade de interação com o ambiente pode ser espacial, sensorial ou comunicacional, exigindo soluções variadas e em constante evolução. A acessibilidade, portanto, não é estática; ela deve acompanhar as mudanças tecnológicas, sociais e culturais. Desde a implementação de rampas e elevadores até o desenvolvimento de tecnologias digitais adaptadas, como leitores de tela e softwares inclusivos, cada avanço é um passo em direção à equidade.
Um ponto essencial é que a acessibilidade precisa ser pensada a partir das demandas reais de todos os grupos da sociedade, e não apenas do olhar de quem projeta os espaços. Esse protagonismo é fundamental para garantir que soluções sejam adequadas, funcionais e respeitosas. Além disso, é importante considerar que o processo de envelhecimento é inerente a todos nós. Com o tempo, nossa forma de interagir com o mundo muda, e espaços acessíveis se tornam indispensáveis para qualquer pessoa, em qualquer etapa da vida.
Os benefícios do desenho universal vão além da garantia de direitos fundamentais. Ele promove maior eficiência e inovação no design de espaços e produtos, ao criar soluções que atendem a um público mais amplo. Ambientes planejados de forma acessível são mais funcionais para todos, reduzindo barreiras não apenas para quem tem deficiência, mas também para pessoas temporariamente imobilizadas, gestantes, idosos ou famílias com crianças pequenas. Uma sociedade que adota o desenho universal, economiza recursos a longo prazo ao evitar reformas e adaptações futuras, e cria um padrão que se adapta às necessidades de uma população diversa e em constante mudança.
Além disso, a prática do desenho universal fortalece o “tecido social”, ao promover uma convivência mais integrada e empática. Quando espaços públicos e privados são projetados para incluir todas as pessoas, criam-se oportunidades para interações mais ricas e diversificadas. Isso contribui para uma sociedade mais coesa, que valoriza e celebra a pluralidade de vivências. Ambientes verdadeiramente acessíveis inspiram uma cultura de acolhimento, onde cada indivíduo se sente respeitado e pertencente.
Falar sobre acessibilidade, portanto, é falar sobre inclusão, direitos humanos e, acima de tudo, sobre todos nós. Um mundo acessível é um mundo que abraça a diversidade e reconhece que as diferenças nos tornam mais fortes como sociedade. Construí-lo é um desafio coletivo, mas também uma oportunidade única de criar ambientes mais justos e acolhedores, onde cada indivíduo tenha a liberdade de ser, viver e participar plenamente.
É nossa responsabilidade provocar reflexões sobre este tema e garantir que nos espaços onde circulamos, a acessibilidade esteja assegurada para todas as pessoas em suas diversidades de corpos, de comunicação e cognitivas.
Relator:
Núcleo de Estudos sobre a Criança e o Adolescente com Deficiência da Sociedade de Pediatria de São Paulo