A Copa do Mundo começa dia 12 de junho. Há uma expectativa gerada pelo grande fluxo de turistas (650.000 estrangeiros e 1.250.000 internos) com aumento de empregos e outros benefícios para nossa economia. Dentro desse panorama, não podemos deixar de estar atentos a questões que podem estragar essa alegria. Com toda essa movimentação, turistas vindos da Europa, Ásia, África e América do Norte podem estar trazendo em suas bagagens, visitantes não tão desejáveis: os vírus. Três deles, em especial, chamam muito nossa atenção nessa época: o do Sarampo, o da gripe A, e o da poliomielite.
O que isso tem a ver com a Copa do Mundo?
Serão 32 seleções vindas de todos os continentes, divididas em 8 grupos, para 12 cidades sede (Belo Horizonte, Brasília, Cuiabá, Curitiba, Fortaleza, Manaus, Natal, Porto Alegre, Recife, Rio de Janeiro, Salvador e São Paulo). Cada uma das seleções vai estabelecer a sua base em uma cidade. Por exemplo, a seleção da Nigéria ficará em Campinas, a da Holanda no Rio de Janeiro, as seleções de Costa Rica e México em Santos, o Irã no Guarujá e assim por diante.
Cada uma das seleções faz três jogos na primeira fase em uma cidade diferente e volta para sua sede. Por exemplo, a seleção da Nigéria joga em Curitiba, Cuiabá e Porto Alegre, indo e vindo a Campinas após cada partida. A seleção do México joga em Natal, Fortaleza e Recife e a de Costa Rica em Fortaleza, Recife e Belo Horizonte e ambas voltam para suas sedes em Santos após cada jogo.
Relação países da Copa e doenças
Entre janeiro e abril de 2014, foi relatada uma epidemia de sarampo em Fortaleza (125 casos) e Recife (186 casos), chegando a seis casos confirmados em São Paulo, com um óbito. Os vírus predominantes foram “importados”. Não temos mais casos autóctones de sarampo desde 2000, fato que fez o governo brasileiro solicitar o certificado de erradicação da doença, durante a 50ª Reunião do Conselho Diretor da Organização Pan-Americana de Saúde em Washington (2010). Essa situação levou a Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo, em fevereiro desse ano, a recomendar a todos os paulistas que fossem viajar para Pernambuco ou Ceará a se vacinarem contra o sarampo dez dias antes da viagem.
Entre novembro de 2012 e dezembro de 2013 foram notificados 12.096 casos de sarampo na Comunidade Europeia. Entre esses países, a maioria dos casos ocorreu na Itália (28%), Reino Unido (19%), Holanda (18%), Alemanha (14%) e Romênia (14%). A situação vacinal era conhecida em 81% de todos os casos e 87% não eram vacinados (8.551 casos). 592 casos de sarampo registrados nas Américas em 2013 e 2014 foram divididos entre os Estados Unidos (187), Canadá (87), Brasil (317), Colômbia (1).
Na África, segundo relatório da OMS sobre epidemias (surtos agudos) em 2012, publicado em 2014, a Nigéria aparece com 6.447 casos, Gana (1.613). Segundo esse mesmo relatório, tivemos casos na Espanha (1.204), Reino Unido (2092) e Rússia (2123).
Mapeando os 8 grupos da Copa, apenas o grupo E (Suíça, Equador, França e Honduras) não apresenta países em que a estatística tenha sido significativa ou que conste de algum dos relatórios divulgados. Junto com os jogadores, cerca de 650.000 turistas estrangeiros chegarão ao Brasil, passeando por 12 cidades (entre elas Recife, Fortaleza e São Paulo) e encontrando-se com 1.250.000 turistas brasileiros que juntos torcerão por 32 seleções.
Última Copa
Em 2010, após a Copa da África, tivemos 61 casos de sarampo na Paraíba e na Argentina, de onde vieram oito casos para Porto Alegre, todos identificados com o vírus do genótipo B3, similar ao que circulou na África do Sul. Nessa época, a maioria dos casos identificados ocorreu em indivíduos não vacinados, pertencentes a faixas etárias que já deveriam ter sido vacinadas.
Poliomielite
A poliomielite é uma doença altamente contagiosa, que afeta principalmente crianças com menos de cinco anos, e que pode causar paralisia em algumas horas e até ser fatal, com o potencial de se espalhar internacionalmente a partir de países endêmicos e dos países reinfectados.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) decretou, no último dia 05/05/2014, estado de emergência de saúde pública para a poliomielite, que é endêmica ou se se propagou para vários países: Afeganistão, Camarões, Etiópia, Guiné Equatorial, Iraque, Israel, Nigéria, Paquistão e Somália. Se não for controlada, a situação poderá colocar em risco a erradicação global da uma das mais graves doenças que pode ser evitada através da vacinação.
E a nossa taxa de vacinação?
De uma forma geral, a cobertura vacinal do Brasil é considerada satisfatória. Segundo a PORTARIA Nº 597/GM de 8 de abril de 2004, a apresentação da carteira vacinação atualizada ainda é obrigatória para efeito de pagamento de salário-família, de matrícula em creches, pré-escola, ensino fundamental, ensino médio e para efeito de recebimento de benefícios sociais concedidos pelo Governo. Além disso, para efeito de contratação trabalhista, as instituições públicas e privadas deverão exigir a apresentação do comprovante de vacinação, atualizado de acordo com o calendário e faixa etária. Mas algumas situações contribuem para que nem toda a população compreenda a importância da vacina.
Há matérias mostrando a presença de grupos anti-vacina nos Estados Unidos e aqui no Brasil. Ainda existe a falsa crença de que a vacina do sarampo causa autismo. Esse foi um estudo publicado no Lancet em fevereiro de 1998 e que teve retratação oficial da própria revista em 2010, mostrando que houve falsificação de dados e que não existe nenhuma comprovação dessa ligação (vacina de sarampo e autismo).
Menos de um mês para a Copa. Ainda dá tempo!
A cada dia que passa, a Copa do Mundo no Brasil se aproxima e diminui o prazo para que possamos proteger nossa população (crianças a adultos) dos riscos do sarampo, gripe, poliomielite, bem como de outras doenças infectocontagiosas que podem ser evitadas por vacinas e por medidas de higiene e cuidados básicos de saúde.
A única vacina exigida em países do mundo como obrigatória em situações de viagem é a vacina contra febre amarela. É necessário que o governo crie medidas de prevenção e, cabe a nós, profissionais de saúde (médicos pediatras fazendo parte fundamental desse grupo) aproveitar esses meses e as campanhas de vacinação para aumentar a cobertura vacinal e divulgar a importância dessa prática já tão reconhecida e bem estabelecida e nosso país.
Embora o Brasil não apresente registro de poliomielite há mais de 20 anos e as frequentes campanhas de vacinação em todo o país garantem alto grau de proteção à população brasileira, devemos permanecer vigilantes quanto ao cumprimento do calendário vacinal.
Para os brasileiros que queiram visitar os países onde a poliomielite foi identificada, é recomendável a atualização da vacina contra essa doença.
Que possamos ganhar a Copa do Mundo de 2014, mas que aproveitemos essa época para ganhar algo muito mais importante e definitivo do que apenas uma competição internacional: a conscientização sobre a importância das vacinas para nossas crianças.
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Relator:
Dr. Moises Chencinski
Departamento Científico de Pediatria Ambulatorial e Cuidados Primários da SPSP
Dr. Mário Roberto Hirschheimer
Presidente da SPSP
Publicado em 12/05/2014.
photo credit: Shao-chun Wang | Dreamstime.com
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