Do homo habilis ao homo ciberneticus

Do homo habilis ao homo ciberneticus

A evolução do ser humano como espécie sempre está atrelada a uma conquista “tecnológica”. Ao dominar o fogo conseguimos amenizar o frio, cozinhar alimentos, proteger-nos de animais ferozes, moldar o ferro, o barro e a argila. Ao dominar o plantio das sementes, fixamo-nos na terra, criamos a agricultura, deixamos de ser nômades, facilitamos o surgimento das cidades. Ao descobrir a escrita facilitamos a comunicação, criamos um meio de perpetuar a cultura. Ao descobrir a prensa, criamos livros, jornais e revistas. Ao criar a roda, possibilitamos o surgimento de novos meios de locomoção. Ao criar a máquina a vapor, desenvolvemos locomotivas e navios. Ao criar o telégrafo, facilitamos a comunicação, encurtamos distâncias. Ao dominar a eletricidade, criamos a lâmpada, desenvolvemos a televisão, o rádio, a sétima arte, etc.

A cada nova descoberta evoluímos. De hominídeos para Homo sapiens sapiens, uma jornada de pelo menos seis milhões de anos. Uma conquista gera outra; um conhecimento gera outro.

Esse impulso extraordinário de criatividade e curiosidade leva o homem a ser descobridor de mistérios. O possível está em sua mente – basta pensar algo novo que se tornará realidade concreta em algum momento. As histórias em quadrinhos, as séries de animações para a TV, os livros de ficção científica, foram grandes precursores, profetizaram um amanhã que hoje desfrutamos. A WEB, a internet, já tinham sido vislumbradas muitos anos antes do seu aparecimento, incrivelmente, pelos “Jetsons”, ou pelos tripulantes da “Enterprise”.

O computador (1944) e a Web (1993) nos transformaram. O uso da internet, desde a sua comercialização na década de 1990, foi mudando o jeito de como fazemos diversas coisas, desde a nossa forma de comunicação até o nosso trabalho.

Quando comemoramos o Dia Mundial da Internet estabelecido pela ONU no ano de 2006, convém refletirmos sobre os avanços que a inteligência humana nos proporciona. A data em questão – 17 de maio – é, também, o Dia Internacional das Telecomunicações, criado por conta da expansão do telégrafo em 1865.

O outro lado da medalha: a maravilha da internet esconde perigos. Cito alguns cuidados que devem ser tomados pelas famílias para preservar os filhos de riscos ao navegar pela internet:

  1. Tomar cuidado com a exposição das crianças nas fotos: existem pessoas que encontram esses conteúdos e os divulgam em sites de pedofilia ou de prostituição infantil. Restringir suas redes sociais para que somente amigos possam ver suas publicações. Instrua seus filhos a não usar a webcam e não trocar fotos ou informações sobre a família.
  2. Proteger as informações pessoais: os golpistas podem se aproveitar dos dados, independentemente da fonte. Tome cuidado ao expor o endereço, o nome da escola dos seus filhos, os locais que a família costuma frequentar. É importante orientar a criança a não compartilhar informações pessoais na internet, nem se cadastrar em sites desconhecidos.
  3. Monitorar o acesso dos filhos à internet: as crianças não dispõem de repertório suficiente para escolherem sozinhas o que pode ser visto na internet e, por isso, é importante monitorar o acesso. A família deve acompanhar essa interação para garantir que a criança entre em contato apenas com o que é saudável. Dependendo da idade dos filhos, é melhor que eles acessem a internet apenas em locais visíveis, o que torna mais fácil acompanhar o que está sendo feito e visto. Ainda que esteja em um site ou canal direcionado a crianças, é importante ter a presença de um adulto, pois é possível que apareçam propagandas e outros conteúdos que tirem a criança da página, levando a locais inapropriados.
  4. Verificar com quais pessoas as crianças têm contato on-line: infelizmente, nem todos são verdadeiros no ambiente das redes sociais; muitos adultos se fazem passar por crianças e procuram outras para conversar. É importante orientar as crianças a conversarem apenas com familiares e amigos conhecidos. É fundamental que elas não troquem mensagens com estranhos.
  5. Avaliar o tipo de conteúdo que os filhos estão consumindo: talvez os materiais acessados não sejam ofensivos ou perigosos, mas também podem não ser relevantes ou interessantes para o desenvolvimento das crianças. Cuidado com jogos e desafios que circulam na rede.
  6. Estabelecer um limite de tempo para o uso da internet: o desafio é saber equilibrar o tempo de exposição a esses conteúdos, de maneira que não prejudique o desenvolvimento e as demais atividades que precisam ser feitas durante o dia. É interessante estabelecer quanto tempo seus filhos podem utilizar o celular, o computador e outros dispositivos. O acesso às tecnologias é importante, mas é preciso ter tempo para as brincadeiras com os amigos, as atividades ao ar livre e outras diversões.
  7. Dialogar sobre os hábitos: o diálogo em casa é eficiente e contribui para que as crianças compreendam os riscos que a internet oferece e saibam lidar com situações em que os responsáveis não estão próximos. O diálogo cria uma relação de confiança.

Riscos ainda mais difíceis de serem avaliados estão ocultos no que chamamos de Inteligência Artificial (IA). Não foi à toa que uma plêiade de pensadores de nomeada pediu, recentemente, uma pausa por seis meses para avaliação sobre o desenvolvimento das pesquisas com IA (ChatGPT – robô virtual que responde a várias perguntas, realiza tarefas por escrito, conversa de maneira fluída e até dá conselhos sobre problemas pessoais). Que “mundo novo” estamos criando, só o futuro nos esclarecerá. Hoje, o medo pode nos paralisar, a arrogância pode nos destruir, a moderação e a ética, entretanto, podem nos amparar. Uma certeza podemos ter – a tecnologia sempre continuará nos transformando.

 

Relator:
Fernando MF Oliveira
Coordenador do Blog Pediatra Orienta da SPSP