Estamos vivendo neste momento — e com pouca visibilidade — o julho Amarelo. Em 28 de julho, comemoramos o Dia Mundial da Luta Contra as Hepatites Virais.
De forma geral a hepatite se manifesta de forma silenciosa, sem sintomas. Os principais sintomas são: febre, cansaço, mal-estar, tontura, enjoo, vômitos, dor abdominal, e presença de pele e olhos amarelados (icterícia), urina escura (acastanhada) e fezes claras da cor de massa de vidraceiro.
No Brasil, têm importância as hepatites “A”, “B”, “C” e, particularmente na região Norte do país, a hepatite “D”. As hepatites “B” e “C” têm tendência a evoluírem para formas crônicas e, pela ausência de sintomas iniciais, faz com que o diagnóstico seja frequentemente tardio. A hepatite “A” tem importância particular entre as crianças e se caracteriza por evolução aguda e, mais raramente, para a forma grave e fulminante.
Em cinco de abril de 2022, o Reino Unido informou um aumento de casos de hepatite de causa desconhecida em crianças menores de 10 anos de idade. Apesar de 30-50% dos casos de hepatite normalmente não possuírem causa conhecida, o que chamou a atenção primeiro no Reino Unido, depois em diversos países da Europa e em descrição retrospectiva (levou em conta um trabalho realizado no passado) nos EUA, foi o aumento na gravidade desses novos casos, com alguns deles necessitando inclusive de transplante de fígado.
O comportamento dessas hepatites mais graves muda nossa perspectiva em relação ao seguimento das hepatites quando no seu diagnóstico. A necessidade de procurar seu médico e de realizar controles periódicos durante o período da doença tornou-se ainda mais relevante e fundamental.
As vias de transmissão das hepatites virais variam de acordo com o vírus responsável. Na hepatite “A” a transmissão se dá por contato oral com água ou objetos contaminados com fezes e vírus – isso tem implicação direta com os locais onde há baixos níveis de saneamento básico e cuidados de higiene pessoal e de alimentos que possam estar contaminados. Há a possibilidade de também haver transmissão por contato próximo com pessoas doentes, o que torna necessário o afastamento de crianças doentes, institucionalizadas ou não, que frequentam creches e pré-escola. A hepatite “B” tem como principal via de transmissão o contato com sangue e secreções contaminadas presentes em objetos de uso pessoal, lâminas de barbear, seringas e agulhas, alicates de cutícula ou outros objetos que furam ou cortam, pela relação sexual (a hepatite “B” é considerada doença sexualmente transmissível), por transfusão de sangue contaminado (hoje muito raro, pois a partir de 1993 os cuidados em bancos de sangue estabeleceram a testagem obrigatória de amostras doadas) ou da mãe infectada para o feto durante a gestação ou parto.
A maioria dos bebês nascidos de mães com Hepatite “B” não apresenta sintomas ao nascimento e podem evoluir no futuro para casos de hepatite crônica; por isso é importante se determinar se a gestante é portadora do vírus “B”, para que se possa instituir no recém-nascido medidas profiláticas com vacina e imunoglobulina específica. A hepatite “C” pode ser transmitida pelo contato com objetos contendo sangue contaminado: no compartilhamento de agulhas, seringas e outros objetos para uso de drogas (cachimbos); reutilização ou falha de esterilização de equipamentos médicos ou odontológicos; utilização de equipamentos de manicure não esterilizados; reutilização de material para realização de tatuagem; uso de sangue e seus derivados contaminados ( hoje muito mais raro pelo controle das amostras doadas) e, de forma menos comum, pela relação sexual. Pode haver transmissão para o feto/bebê durante a gestação. Também para a hepatite C é importante a testagem durante o pré-natal. Como hoje a hepatite C pode ser tratada com drogas fornecidas pelo SUS, a detecção desta doença silenciosa é de grande importância, sendo que a gestação é uma oportunidade para esta triagem.
Devemos ressaltar que as hepatites “A” e “B” dispõem de vacinas muito eficazes e seguras na prevenção da doença e que fazem parte do Programa Nacional de Imunizações (PNI) e, portanto, estão disponíveis pelo SUS. A vacina para Hepatite “A” deve ser aplicada a partir dos 12 meses. A vacina para hepatite “B” deve ser aplicada em três doses, distribuídas no primeiro ano de vida e está também disponível na rede de saúde para pessoas não vacinadas de outras idades. Não há vacinas disponíveis para a prevenção da hepatite “C”, o que torna evidente a necessidade de medidas de controle de contágio, para que pessoas sabidamente positivas para esse vírus não transmitam a infecção a outras pessoas.
Relatores:
Irene Walter de Freitas
Marcelo Otsuka
Eitan N Berezin
Departamento Científico de Infectologia da SPSP
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