Este não é um artigo escrito de “mulher para mulher”. Não precisei também resgatar meu lado anima para escrevê-lo. Como homem e pediatra, registro aqui algumas palavras sobre esta data…
As origens do Dia Internacional da Mulher remontam ao início do século passado. Movimentos reivindicatórios surgiram tanto nos EUA (fevereiro de 1909), quanto na Rússia (8 de março de 1917) e em outros lugares da Europa (Alemanha, 1910), solicitando remuneração mais justa, diminuição da jornada de trabalho (16 horas na época), férias. Na sequência, surgiu o pedido de direito ao voto. Enfim, os movimentos civis por direitos sempre nascem de uma discriminação, de uma marginalização. Pressupõem uma partilha de poder desigual (há sempre um agente opressor) e uma visão que classifica as pessoas diferentes em desiguais, algumas têm privilégios que outras não devem ter.
Um pouco da história das lutas das mulheres no Brasil:
- 1827: meninas são liberadas para que frequentassem colégios, enfim, estudassem além da alfabetização.
- 1879: mulheres podem ser aceitas em faculdades, no ensino superior.
- 1887: surge a primeira médica brasileira – Rita Lobato Freitas, formada pela Faculdade de Medicina da Bahia. Ela foi a segunda na América Latina.
- 1919: resolução de salários iguais para homens e mulheres é aprovada.
- 1923: a enfermagem começa no Brasil através da Escola de Enfermagem Ana Nery.
- 1934: mulheres conquistam o direito de votar. O voto feminino passa a ser regulamentado no país, para mulheres de todas as rendas, origens ou estado civil.
- 1962: é criado o Estatuto da Mulher Casada. Em 27 de agosto, a Lei nº 4.212/1962 permitiu que mulheres casadas não precisassem mais da autorização do marido para trabalhar.
- 1977: a Lei do Divórcio é aprovada no dia 26 de dezembro, a Lei nº 6.515 foi sancionada.
- 1980: as Forças Armadas passam a aceitar também mulheres na carreira militar.
- 1985: surge a primeira Delegacia da Mulher. A DEAM (Delegacia de Atendimento Especializado à Mulher) surge em São Paulo e, logo depois, outras unidades começam a ser implantadas em outros Estados.
- 2002: “Falta de virgindade” deixa de ser crime. O Código Civil retirou o artigo que dizia que um homem podia pedir a anulação do casamento caso descobrisse que a esposa não era virgem.
- 2006: é criada a Lei Maria da Penha. A Lei nº 11.340 foi sancionada para combater a violência contra a mulher.
As mulheres, ao longo da história, tiveram que lutar para que fossem vistas de modo diferente e pudessem se inserir na sociedade, desempenhando diversos papéis sociais jamais imaginados. Qual é o perfil de mulher que o século XXI, que mal começou, necessita? Certamente não é aquele das “Mulheres de Atenas”, de Chico Buarque; nem tampouco da “Amélia – a mulher de verdade”, de Ataulfo Alves, ou da “mulher virtuosa”, do texto de Salomão no livro de Provérbios. Estas descrevem facetas do feminino para um tempo específico. Cada época haverá de ajudar a configurar o perfil de mulher adequado ao seu universo.
Somos todos – homens e mulheres – metamorfoses ambulantes, já disse o “Maluco Beleza”. O mundo atual, complexo, veloz e cambiante, exige esse comportamento de lagarta. Portanto, é importante que se assegure:
- total liberdade para que a mulher se insira no mercado de trabalho;
- que tenha garantido o direito de ser cidadã, na pólis, como qualquer outro indivíduo dessa mesma sociedade;
- que lhe sejam oferecidas oportunidades iguais para o seu desenvolvimento como pessoa.
Lembro, ainda, uma lista de direitos defendidos enfaticamente pela SPSP:
- um período de amamentação estendido pós-parto, assegurando-se o posto de trabalho ocupado pela mulher;
- a garantia de que no período crucial dos 1.000 dias de cada filho, sejam-lhe garantidos, de maneira adequada: pré-natal e atenção ao parto; cuidados ao recém-nascido e seguimento de puericultura; creche para os filhos, para que possa trabalhar em paz e produtivamente.
Quero homenagear as pediatras. Nossas colegas de profissão, brilhantes e dedicadas, que fazem malabarismos para conciliar uma atividade exigente e cansativa, com a dupla jornada do lar e da maternidade. Saúdo aquelas que se dedicam ao estudo acadêmico e contribuem com a sua inteligência para a riqueza acumulada do conhecimento e desenvolvimento da medicina e, em especial, da pediatria. Ao saudá-las, quero homenagear todas as mulheres. Finalizo resgatando da memória uma história singular e real: “a mulher, em sua singeleza de coração, em sua gratidão incontida e sincera, trouxe um bolo em agradecimento à equipe do hospital onde seu filho foi bem acolhido e tratado. Ao final da degustação, com o sorriso largo, de “canto a canto do rosto”, aquela mulher, orgulhosíssima, disse: “eu que fiz”, e acrescentou, amparando e elevando os seios para cima, “com este leite aqui”. E aí deu o produto mais sublime que era capaz de produzir.
As mulheres são capazes de nos surpreender, sempre e de muitas maneiras. “Benditos somos nós, homens, entre as mulheres”. Amém.
Relator:
Fernando MF Oliveira
Coordenador do Blog Pediatra Orienta da SPSP