Quando engravidei de minha primeira filha, decidi que o leite materno seria seu alimento. Sabia de seu valor nutricional e imunológico, mas sobretudo da importância desse contato pele a pele para nossa interação e troca afetiva.
Lembro da primeira mamada e da satisfação que senti ao ver que ela já sabia mamar! Mas nosso momento sagrado não impediu as dores da descida do leite, o peito inchado, duro e quente, que me deixou assustada e aflita. Além do mamilo que ardia até pelo contato com a roupa, fatos que tornaram os primeiros dias um desafio.
Minha dificuldade pareceu superável quando testemunhei o desespero de outras mães na maternidade. Algumas nem mesmo conseguiam acalmar o bebê para que ele pegasse o peito. Choravam junto com eles.
O mamilo se habituou e a pega melhorou. Tudo parecia bem até a primeira visita ao pediatra – não ganhou o peso necessário! Frase que inaugurou uma preocupação constante durante quatro meses. Muito leite e pouco ganho de peso. Ida ao pediatra para pesar o bebê – diariamente! Só tínhamos esse assunto com os amigos e parentes. Todos tinham uma receita, uma indicação, um conselho. Eu só queria um modo de continuar a amamentar.
Quando a pediatra que brigava com a balança receitou fórmula questionei: “Mas por que, se eu tenho tanto leite?” Não me convenceu. Encontrei um pediatra que me escutou com tranquilidade, me apoiou e me ajudou a ver que minha filha estava satisfeita e se desenvolvia bem, apesar da balança. Assim foi possível que ela mamasse no peito até quase um ano.
Quando ia nascer minha segunda filha, ele me orientou a amamentá-la na sala de parto. Foi um começo mais fácil. Além disso, eu já tinha aprendido. Só precisávamos nos conhecer e acertar o ritmo dela. Mamou por mais de um ano!
A experiência com minhas duas filhas me fez ver que amamentar é um processo, uma construção, um percurso entre a mãe e o bebê e com o apoio fundamental do pai e um pediatra sábio. Não é fácil nem mágico, mas pode se tornar a experiência mais inesquecível de nossas vidas.
Sendo psicanalista, decidi voltar-me para o estudo da experiência psíquica relacionada à amamentação. Dediquei-me a escutar as mães, os pais, observar os bebês, traduzir seus conflitos, suas angústias, seus medos e, desse modo, permitir que emerja o prazer compartilhado e que a amamentação possa se manter nessa troca afetiva.
A amamentação em seu aspecto psíquico passou a ser meu foco de pesquisa acadêmica (mestrado e doutorado) e tem sido um de meus grandes interesses nos últimos 20 anos, promovendo cursos e publicações para profissionais de saúde, além de uma clínica voltada à primeiríssima infância (0 a 3 anos).
Amamentação é a base da vida, sim. Mas, para a dupla amamentar, são necessários uma rede de apoio que possa estar ao seu lado, um olhar confiante e ouvidos atentos e disponíveis para escutar.
Denise de Sousa Feliciano
Mãe de Thais (22 anos) e Elisa (20 anos).
Psicanalista do Grupo de Saúde Mental e do Departamento Científico de Aleitamento Materno da SPSP.
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Publicado em: 4/08/2018
Este blog não tem o objetivo de substituir a consulta pediátrica. Somente o médico tem condições de avaliar caso a caso e somente o médico pode orientar o tratamento e a prescrição de medicamentos.
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