8 de setembro – Dia Mundial da Fibrose Cística

8 de setembro – Dia Mundial da Fibrose Cística

A Fibrose Cística (FC) ou Mucoviscidose, é uma doença genética rara, ainda sem cura, que afeta vários órgãos do organismo, manifestando-se com problemas respiratórios e gastrointestinais. Outros locais acometidos pela doença são as glândulas sudoríparas, o sistema reprodutor, o fígado e as vias biliares. O suor apresenta uma grande quantidade de sal, sendo conhecida como a “doença do beijo salgado”.

A FC acontece quando cada um dos pais apresenta um gene da FC (são portadores sem doença) e transmitem à criança os dois genes (são necessários os 2 genes para manifestar a doença). Esse gene, chamado CFTR (cystic fibrosis transmembrane conductance regulator – regulador de condutância transmembrana em fibrose cística), faz com o que o organismo produza uma secreção muito mais espessa que o normal, dificultando o funcionamento adequado dos órgãos afetados, principalmente os pulmões e o intestino.

O quadro clínico da FC é variável, mas a doença geralmente se manifesta já nos primeiros meses de vida, com sintomas gastrointestinais e pulmonares. São comuns os sintomas gastrointestinais, decorrentes da insuficiência pancreática, presentes em 85% a 90% dos pacientes, como fezes amolecidas, várias vezes ao dia, muito fétidas e gordurosas (as fezes ficam “brilhantes”). A criança não consegue ganhar peso e crescer de forma adequada e, caso não seja tratada, leva à desnutrição grave.

Nos pulmões, a secreção espessa (catarro) leva a infecções de repetição e dificulta a respiração. Os sintomas respiratórios comuns são: chiado no peito, falta de ar, tosse seca inicialmente e posteriormente com catarro (tosse produtiva). Os seios da face são atingidos frequentemente, levando a sinusopatias.

A FC é uma doença grave e progressiva, isto é, piora conforme aumenta a idade, sendo fundamental que o diagnóstico seja feito o mais precocemente possível para a instituição de tratamento adequado.

A primeira forma de identificar pacientes com suspeita de FC é pela Triagem Neonatal (Teste do Pezinho). Os recém-nascidos, em geral, coletam o Teste do Pezinho entre o segundo e o quinto dia de vida; nos casos de FC uma enzima produzida pelo pâncreas no sangue, a Tripsina Imunorreativa (TIR), apresenta valor elevado. Caso o primeiro teste venha alterado, deve-se coletar um segundo teste, geralmente no 15º dia de vida. Se a tripsina também vier aumentada, há uma alta suspeita de ser a FC.

O teste do suor deve ser realizado para a confirmação do diagnóstico. Este teste avalia a concentração de cloreto (um dos componentes do sal) no suor, sendo que valores altos indicam a doença (concentração do cloreto ≥ 60 mmol/L). Deve ser coletado em duas ocasiões diferentes; caso o teste venha alterado nas duas vezes o paciente deve ser encaminhado para um Centro de Referência de FC.

Nos pacientes que apresentam sinais e sintomas sugestivos da doença – sintomas pulmonares e/ou gastrointestinais – o teste do suor deve ser realizado, mesmo que o Teste do Pezinho tenha sido normal para FC.

O teste genético é indicado para pacientes que apresentam teste do suor com nível de cloreto considerado duvidoso, para planejamento familiar e, atualmente, pelo grande interesse nas novas drogas da FC, chamadas Moduladores do CFTR (ver adiante).

O acompanhamento dos pacientes deve ser realizado em Centros de Referência de FC, com profissionais de diferentes áreas da saúde.

O tratamento na maioria dos pacientes inclui a reposição das enzimas pancreáticas, suplementação de sal (pela perda no suor), vitaminas, suporte nutricional, medicamentos para fluidificar a secreção do pulmão e antibioticoterapia para as infecções pulmonares.

A terapêutica se baseia nos sintomas para prevenir a progressão da doença. Os principais medicamentos para tratamento do quadro pulmonar incluem inalação com fluidificantes, com solução hipertônica, antibióticos inalatórios ou orais.

A fisioterapia respiratória é de extrema importância no tratamento, fazendo parte da rotina diária de todos os pacientes.

Necessitam de uma dieta com mais calorias e reposição de enzimas pancreáticas em todas as refeições, para digestão e absorção de gorduras, proteínas e outros nutrientes. Os suplementos alimentares para aumentar o aporte calórico e vitaminas são fundamentais para manter o estado nutricional adequado.

O tratamento da FC inclui vários medicamentos, os quais são dispensados pelo Sistema Único de Saúde (SUS), aos pacientes através das farmácias de alto custo.

Recentemente o maior avanço no tratamento da FC foram os Moduladores do CFTR (são medicações que atuam no defeito genético da FC – melhoram a produção, o processamento dentro das células e a função da proteína com defeito). 

A escolha do medicamento é determinada pelo teste genético, isto é, pelo tipo de mutações do paciente. Não representa a cura da doença, mas os vários órgãos atingidos voltam a funcionar de forma adequada.

Os benefícios dos Moduladores do CFTR foram demonstrados com melhora da função pulmonar, diminuição das infecções pulmonares, das internações, melhora no ganho ponderal, na qualidade de vida e prevenção da progressão da doença. O tratamento é por via oral e deve ser para a vida toda.

O primeiro modulador do CFTR, ivacaftor (Kalydeco), foi incorporado ao SUS em 2020, para pacientes acima de 6 anos de idade e dispensado para as pessoas com FC elegíveis (precisam apresentar determinado tipo de mutação genética). São poucos os pacientes candidatos para esta medicação. A distribuição em São Paulo se iniciou em outubro de 2022.

Outro modulador do CFTR é o Trikafta, que é uma combinação de três drogas (elexacaftor, tezacaftor + ivacaftor), aprovado pela Anvisa em 2022. É indicado em pacientes com uma ou duas mutações F508del e mais de 70% deles poderia se beneficiar dessa terapêutica.

Em 3 de agosto de 2023 a CONITEC (Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde – SUS) aprovou a incorporação no SUS do medicamento Trikafta, para pacientes acima de 6 anos, para tratar FC.

O Trikafta representa uma nova realidade para os pacientes com FC, uma vida com maior qualidade e aumento da sobrevida.

 

Relatora:

Sonia Mayumi Chiba
Responsável pelo Ambulatório de FC na UNIFESP
Chefe do Setor de Pneumopediatria da UNIFESP
Pneumologista do Hospital Infantil Sabará
Departamento Científico de Pneumologia da Sociedade de Pediatria de São Paulo