8 de dezembro – Dia Nacional da Família

8 de dezembro – Dia Nacional da Família

Esta data comemorativa nos constrange a pensar na Família/no Lar como ponto de equilíbrio físico e emocional para um mundo conturbado.

Há o nascimento biológico e o nascimento cultural. O primeiro se refere ao fato de que um nascituro “veio ao mundo”. O segundo se relaciona com o acolhimento dado ao “produto desse evento”. Idealmente, cabe à família processar esse nascimento cultural: nomear o recém-nascido, dando-lhe uma genealogia; acolher, provendo o bebê com os cuidados necessários para a sua sobrevivência; oferecer os meios adequados para o seu desenvolvimento físico, cultural e ético; equipar com habilidades cognitivas e inteligência emocional; preparar para o futuro (livro Manifesto antimaternalista – informação abaixo) 

Idealmente, a família deve oferecer “ao que veio ao mundo” um Lar – o ninho, o refúgio, o porto seguro, para aquele ser totalmente indefeso e dependente. Família é o primeiro local de “validação” de um ser humano – chancela o “sou gente”, o “sou benquisto”.

Família é o “espaço social” onde se aprende tanto a amar, quanto a odiar; a respeitar ou desrespeitar; a dizer a verdade ou a mentir; a ser ético ou imoral; a ser virtuoso ou maldoso; a ser resiliente ou fraco; a ser generoso ou sovina; a ser humilde ou arrogante; a ser prepotente ou a reconhecer o outro e desenvolver a alteridade.

Esse “espaço social” chamado família deve ser, também, um “espaço sagrado” – bem-aventurado, inviolável, respeitável, “separado – porque diferente e desejado”.

Estamos vivendo tempos que parecem “estranhos”; o mundo deixou de ser um “lugar comum”. Temos a sensação de estar “sem casa”, parecemos “estranhos no ninho”.

A família necessita ser neste mundo em que vivemos um ambiente de intensa e corajosa resistência ao comportamento contemporâneo: apressado, consumista, imediatista, narcisista. Isso, implica em desenvolver uma “outra política de tempo”, necessária para estabilizar a vida – um tempo de qualidade.

As práticas que demandam dedicação de tempo prolongado, como, por exemplo, a busca pela verdade, a confiança, a responsabilidade, a fidelidade, o compromisso, a criação de vínculos, a arte da contemplação, estão desaparecendo hoje em dia. Todos esses elementos exigem dedicação de tempo  (livro Não coisas – reviravoltas do mundo da vida- informação abaixo).

Dedicação de tempo envolve separar no tempo ordinário (contínuo) um tempo qualitativo. Necessitamos adentrar repetidamente nesse espaço diferenciado no tempo.

Separar um tempo qualitativo dá trabalho. É uma cultura que precisa ser desenvolvida pelas famílias e individualmente, como um verdadeiro “ritual”. Os rituais estabelecem um lugar de segurança no tempo e no espaço, de aconchego, onde se “distingue um dia do outro, uma hora da outra”. Os rituais são técnicas de fechamento temporal. Eles transformam o “estar-no-mundo” em “estar-em-casa”. Eles são arquiteturas temporais. Desta forma, eles tornam o tempo habitável. Os rituais são repetitivos.

A repetição é didática, ensina. A expressão francesa “savoir par coeur, que significa ‘saber por intermédio do coração’ – “saber de cor”, é um símbolo poético e bíblico da inteligência, do pensamento, dos sentimentos. Essa expressão surgiu em meados do século XVI e indica um saber por intermédio de experiências.

A seu tempo, busque um tempo para ter tempo, especialmente em família.

 

Saiba mais:

Este texto foi inspirado pela leitura de dois livros que recomendo fortemente a leitura:
. Manifesto antimaternalista: Psicanálise e políticas de reprodução. Vera Iaconelli. Rio de Janeiro: Zahar, 2023.
. Não coisas – reviravoltas do mundo da vida. Byung-Chul Han; Petrópolis, RJ: Vozes, 2022.

 

Relator:
Fernando MF Oliveira
Coordenador do Blog Pediatra Orienta da SPSP