Sociedade de Pediatria de São Paulo
Texto divulgado em 05/05/2022
Lavar as mãos – 3 palavras!
Comer com as mãos era hábito comum entre os humanos, assim como entre os primatas. Usar talher é produto da cultura, veio depois. Lavar as mãos antes das refeições também é fruto de um avanço cultural. As razões para essa mudança não são tão óbvias assim: será que o determinante inicial foi o nojo? Será que a contaminação da comida pela mão suja alterou o paladar de algum alimento? Hoje temos clareza que a coisa deve ser feita por absoluta higiene, ou seja, deve-se evitar contaminar o organismo com agentes vivos, ou materiais nocivos à saúde.
Higienizar.
O ato de lavar as mãos – a ablução (lavagem com água) tem origens muito antigas e ligadas à religiosidade. Nesse sentido, nesse ato simbólico, as mãos tornam-se puras, limpas, para poder tocar ou participar de algum ritual sagrado.
Purificar.
Tornar as mãos adequadas para o uso sem submeter ao risco (tornar impuro, contaminado) a própria pessoa, o outro, ou algum objeto sagrado.
A higiene das mãos na área da saúde ganhou profunda importância a partir de 1846, quando o médico húngaro Ignaz Semmelweis identificou uma diferença estranha entre as clínicas sob sua responsabilidade: as mortes na clínica utilizada para o ensino de jovens médicos onde, além dos partos, realizavam-se autópsias e cirurgias, chegavam ao triplo da outra, onde era feito o treinamento de enfermeiras-parteiras. O médico atribuiu essas mortes, ao que chamou de ‘partículas cadavéricas’ que, aderidas às mãos dos médicos, estariam contaminando as pacientes. Essa constatação, fez com que se determinasse a lavagem das mãos com uma solução de água e cal clorada antes do contato com o paciente.
Com o advento do microscópio (criado por Antony Van Leewenhoek em 1674, contando com a contribuição de um trabalho precedente de Robert Hooke, 1665), que permitiu a identificação das bactérias, se concluiu, definitivamente, essa correlação.
HOJE, EM TEMPOS DE PANDEMIA, ESTAMOS CIENTES DESSA IMPORTÂNCIA!
As mãos que tocam e afagam podem ser aquelas que sacam uma arma, desferem um soco, constroem arte em telas e fazem esculturas e, também, transmitem agentes infecciosos. Nas mãos, há o poder de salvar e matar.
A figura histórica de Pôncio Pilatos, ao lavar as mãos no julgamento do Homem de Nazaré, fez com que o gesto ganhasse a significação de “eu não tenho nada a ver com isso”. Indiferença pragmática.
Proponho uma imagem simbólica para facilitar nossa atuação profissional: lavem as mãos porque o outro (o paciente) é sagrado. Nele está a vida. Nossas ações em saúde sempre envolvem mais alguém – o paciente e sua família. Temos que lavar as mãos, exatamente porque temos tudo a ver com eles – a saúde deles está em nossas mãos.
Lavar as mãos, no ato médico, é uma maneira singela de honrar aqueles que nos buscam em situação de vulnerabilidade.
Relator:
Fernando MF Oliveira
Coordenador do Blog Pediatra Orienta da Sociedade de Pediatria de São Paulo
Foto: sergio leon | depositphotos.com