Falar é externar seu eu – emoções, desejos – mesmo sem ver, apenas escutando a voz, podemos identificar várias características das pessoas. A fala deve sair fluente, sem esforço… o foco principal deve ser na mensagem e não na forma.
E quando a fala está alterada? Há prejuízo na comunicação, o ouvinte foca mais em como está a fala do que no conteúdo. A gagueira, uma alteração da fluência da fala, com quebras, repetições, pausas, movimentos associados, chama muito a atenção para o interlocutor, gera julgamento… muitas vezes a pessoa que gagueja é vista como insegura, incapaz, sem controle emocional. Durante muitas décadas supôs-se, sem base científica, que era criada quando os pais chamavam a atenção dos filhos para a disfluência da fala, de que estes supostamente não teriam consciência. Wendel Johnson, que teve grande influência, era defensor da teoria de que “a gagueira começa no ouvido dos pais e não na boca da criança”. Isto fez com que a orientação dada era a de que não se devia chamar a atenção para os momentos de disfluência, deviam ignorar, sendo considerado normal gaguejar até os 5 anos de idade.
Por muitos anos a gagueira foi considerada uma alteração emocional. Hoje sabemos que não é assim; a gagueira é um transtorno do neurodesenvolvimento, perturbação do funcionamento das áreas cerebrais responsáveis pela temporalização da fala, afetando seu ritmo e coordenação. Sua manifestação é intermitente: pode ficar dias, semanas sem se manifestar e em outros momentos ser muito acentuada.
Suas causas ainda não são completamente compreendidas, há combinação de fatores genéticos e ambientais, inclusive infecciosos, que podem desencadear as disfluências. É importante notar que não está relacionada à inteligência ou capacidade cognitiva da pessoa. Muitos indivíduos são altamente inteligentes e bem-sucedidos em sua vida pessoal e profissional.
Tem início nos primeiros anos da infância, tanto em meninos quanto em meninas. A maioria vai ter resolução espontânea da gagueira e nenhum tratamento é necessário. Porém devemos ficar atentos aos fatores que aumentam muito a chance de cronificação (persistência dos sintomas): ser menino, instalação gradual da gagueira, história familiar com outras pessoas que gaguejam, especialmente se forem do sexo masculino, outras alterações de fala e linguagem associadas, início após os três anos de idade, história familiar, tensões musculares durante a fala, alterações emocionais, mais de duas repetições por episódio e início da terapia fonoaudiológica após 1 ano do início dos sintomas.
Nos casos com fatores de risco, uma investigação médica e fonoterapia devem ser iniciadas o mais breve possível. Pois o tratamento é benéfico em qualquer idade.
O Dia Internacional da Gagueira é celebrado em 22 de outubro; tem por objetivo aumentar a conscientização sobre a gagueira e promover a compreensão e aceitação das pessoas que gaguejam.
Lembre-se que cada criança é única e o que funciona para uma pode não funcionar para outra. O apoio da família é fundamental para ajudar as crianças a lidar com a gagueira e desenvolver habilidades de fala mais fluentes.
Como os pais, familiares e professores podem apoiar as crianças que gaguejam?
- Busque orientação profissional: Se você suspeita que seu filho está gaguejando, é importante procurar a orientação de um foniatra ou fonoaudiólogo. Eles podem avaliar a gravidade do problema e criar um plano de tratamento adequado.
- Evite pressionar a criança: É fundamental não pressionar a criança a falar mais devagar ou corrigir sua fala constantemente. Isso pode aumentar a ansiedade e agravar a gagueira.
- Ouça com paciência: Dê atenção às palavras da criança e demonstre interesse pelo que ela está dizendo. Isso ajuda a reduzir o estresse e a pressão associados à fala.
- Fale com calma e devagar: Modelar uma fala tranquila e pausada pode ser útil. Fale naturalmente, mas evite apressar a conversa.
- Evite interrupções: Não interrompa a criança enquanto ela está falando. Permita que ela termine suas frases e pense no que quer dizer.
- Crie um ambiente de apoio: Incentive a autoestima da criança e seu senso de confiança. Ajude-a a entender que a gagueira não a torna menos valiosa como pessoa.
- Pratique a escuta ativa: Faça perguntas abertas e mostre interesse genuíno pelo que seu filho tem a dizer. Isso pode ajudar a reduzir a pressão e a ansiedade associadas à fala.
- Estabeleça uma rotina de prática: Se o fonoaudiólogo recomendar exercícios ou técnicas para praticar em casa, siga a orientação e crie uma rotina regular para praticar com seu filho.
- Esteja atento a mudanças emocionais: A gagueira pode ser uma fonte de estresse para as crianças. Esteja atento a quaisquer mudanças emocionais ou comportamentais e converse com um profissional de saúde, se necessário.
- Mantenha-se informado: Aprenda sobre a gagueira e como melhor apoiar seu filho. Há muitas organizações e recursos disponíveis para pais de crianças que gaguejam.
Relatora:
Sulene Pirana
Núcleo de Estudos de Desenvolvimento e Aprendizagem da Sociedade de Pediatria de São Paulo