Sociedade de Pediatria de São Paulo
Texto divulgado em 21/03/2022
O Dia Internacional contra a Discriminação Racial, 21 de março, foi escolhido pela Organização das Nações Unidas em memória às vítimas fatais do “Massacre de Sharpeville”, ocorrido na África do Sul, em 1960, durante o regime do apartheid.
A data representa a luta pelo fim do preconceito, discriminação e racismo, que não se refere apenas a cor da pele, mas também à religião, sexo, gênero e etnia.
No Brasil, desde a Assembleia Nacional Constituinte de 1988, o racismo é crime inafiançável e imprescritível. Mesmo assim, permanece latente no país.
Inicialmente, vamos definir alguns termos, que muitas vezes são usados como sinônimos, mas não o são.
Preconceito é uma opinião equivocada que antecede o conhecimento sobre uma pessoa, fato ou situação. Ela é norteada pela intolerância e não apresenta base científica ou de realidade.
Enquanto o preconceito é uma ideia, a discriminação é uma ação, geralmente ostensiva, sustentada por opinião preconceituosa e que leva a segregação.
Preconceito e discriminação podem ter caráter social, religioso, cultural, linguístico, de gênero, quanto à orientação sexual, racial (racismo) e a estrangeiros (xenofobia).
Acreditar que um jovem andando na rua seja um ladrão por sua cor é um preconceito. Impedi-lo de entrar num restaurante é discriminação.
Raça e etnia também não são sinônimos.
A palavra etnia significa “povo que tem os mesmos costumes”. Define um grupo com a mesma origem, língua e cultura que são transmitidas de geração a geração.
Raça é conceito biológico determinando subclasses de uma mesma espécie. Como não há subclasses dentro da espécie humana, esse conceito não se aplica.
O Brasil possui enorme miscigenação étnica: indígenas, portugueses, holandeses, italianos, negros, japoneses, árabes, caboclos e mulatos formam a aquarela das etnias nacionais. Não há diferença racial entre os brasileiros; não há várias raças humanas e sim uma ÚNICA espécie humana.
O racismo é perverso. Considerado um dos principais determinantes das desigualdades sociais, exacerba a pobreza, leva a resultados escolares negativos, menor acesso a emprego, maior exposição à criminalidade, ameaça ao bem-estar, saúde física e mental de adultos e crianças.
Pelo conceito de “vidas vinculadas”, o que atinge uma pessoa pode afetar as demais. A ação racista gera efeitos nocivos indiretos sobre as crianças que testemunham, ouvem, leem ou assistem, mesmo que online, seus pais, cuidadores, familiares, amigos ou desconhecidos serem maltratados ou prejudicados por atitudes racistas. Elas podem imaginar a si mesmas ou a um ente querido no lugar do alvo e, assim, sofrer consequências emocionais, psicológicas ou fisiológicas. As experiências de discriminação racial dos cuidadores podem levar a tensões na relação pais-filhos, a conflitos familiares, práticas parentais duras e violentas.
Essas experiências, vivenciadas em fase de desenvolvimento, ameaçam o senso que a criança tem de um mundo justo e seguro, gerando sentimento de desamparo, medo e desespero. Crianças mais novas podem ser afetadas mais intensamente, enquanto adolescentes podem ter habilidades de enfrentamento mais desenvolvidas.
A saúde mental é a que sofre maior efeito negativo, com sentimentos de baixa autoestima, ansiedade, depressão, ideação suicida e suicídio.
Quanto à saúde física, obesidade e hipertensão arterial parecem ter associação com experiências racistas.
Medidas preventivas contra preconceito, discriminação e racismo passam pela educação de um povo, lapidação de seus valores e crenças para que atitudes sejam transformadas. Acesso à escola, trabalho, moradia, saúde e compaixão são responsabilidade não de um governo, mas sim de toda sociedade.
Relatora:
Stela Maria Tavolieri de Oliveira
Núcleo de Estudo da Violência Doméstica contra a Criança e o Adolescente da Sociedade de Pediatria de São Paulo
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