Dia do Combate ao Abuso e Exploração Sexual contra Crianças e Adolescentes

Dia do Combate ao Abuso e Exploração Sexual contra Crianças e Adolescentes

O abuso e a exploração sexual de crianças e adolescentes são questões complexas, que envolvem a ação e atuação articuladas de diferentes setores da sociedade, para que ocorra atenção adequada para as crianças, adolescentes e suas famílias envolvidos nesta situação e para que aconteça a prevenção e combate apropriados e corretos.

O abuso sexual envolve o uso de uma criança ou adolescente para satisfação das demandas sexuais de outra pessoa. Envolve sempre uma disparidade de poderes entre os participantes, pode abranger diversas atividades de cunho sexual além da penetração, tais como exposição à pornografia, mensagens de cunho sexual, beijos, toques e carícias em qualquer região do corpo, contato com os genitais da criança ou do adulto sem penetração, entre outras.  A maior parte dessas atividades não provoca lesões físicas visíveis, mas pode deixar sequelas psicológicas para o resto da vida.

A exploração sexual envolve uma troca comercial ou a obtenção de algum tipo de vantagem para a obtenção de satisfação sexual. Podem ser classificadas como exploração sexual: trocas sexuais, pedofilia, prostituição, pornografia, turismo sexual e tráfico de pessoas.

Estima-se que 25% das pessoas tenham passado por alguma situação sexualmente abusiva ao longo de suas vidas. A maior parte dos abusos acontece na infância e adolescência, que são períodos de maior vulnerabilidade. Os abusadores geralmente são pessoas próximas, que gozam da confiança da criança e da família. Na maioria dos casos o abusador é um membro da família. Os abusadores sexuais na maioria das vezes não possuem nenhuma característica especial que levante suspeita, podem ser pessoas inseridas normalmente em sua comunidade.

Ao contrário de outras formas de violência, onde os danos físicos, as ameaças e o sofrimento são mais evidentes, as situações de abuso sexual podem acontecer de forma muito mais insidiosa e sutil, o que dificulta sua identificação. O abuso é um processo, em que ao longo do tempo o abusador vai manipulando a criança para que esta participe das atividades de cunho sexual. Nem sempre estão envolvidas ameaças diretas ou agressões.

É importante saber que o fato da criança gostar das atividades propostas pelo abusador não deixa de ser abuso – afinal, é o adulto que conhece as regras e limitações impostas pela sociedade para as práticas sexuais e é responsabilidade desse adulto não violar estas regras ou impedir que a criança o faça.

A legislação brasileira proíbe a atividade sexual com menores de 14 anos (incluindo relação sexual ou outras atividades que não envolvam penetração), no crime de estupro de vulnerável (art. 217 do Código Penal, 2009) – é crime, independente do desejo da criança de participar das atividades sexuais.

Muitas situações de abuso sexual têm o segredo como um de seus componentes principais. Vergonha e medo das consequências são as principais causas para que as crianças, os adolescentes e os demais familiares tenham receio de expor o abuso, o que dificulta a sua identificação, aumenta a sua duração e piora seu impacto.

Os resultados de uma situação de abuso sexual vão muito além dos riscos de gestação e de transmissão de doenças sexualmente transmissíveis. Crianças abusadas podem ter dificuldades para compreender e respeitar limites, podem ter relacionamentos interpessoais prejudicados pela falta de formação de vínculos de confiança, podem apresentar baixa autoestima e ter maior vulnerabilidade a novos abusos, pela incapacidade de identificar e reagir adequadamente a estas situações.

A revelação de uma situação de abuso sexual não é fácil, pois envolve a quebra deste segredo e uma sensação de riscos, reais ou imaginários, para todos os envolvidos. É extremamente importante que todo relato de abuso sexual de uma criança ou adolescente seja levado a sério, sem duvidar de suas palavras ou atrasar as ações de proteção na busca de provas mais objetivas, que raramente são obtidas. A sensação de culpa por falhar em proteger a criança e o medo do risco de desestruturação familiar fazem com que muitos responsáveis neguem o que a criança diz, levando a interrogatórios opressivos em busca da “verdade”, acareações que não resolvem nada ou simplesmente ignoram os pedidos de ajuda da criança, o que aumenta nelas a sensação de desamparo, impotência e abandono.

A resolução das situações de abuso sexual passa pela quebra do segredo, identificação das necessidades de todos os envolvidos, estabelecimento de limites claros e responsabilização dos agressores. Estas soluções somente serão possíveis quando a temática da violência sexual puder ser discutida abertamente com a sociedade em geral e, mais especificamente, com os atores sociais encarregados de lidar com estas situações. Para todos os profissionais envolvidos, é importante a clareza dos papéis de cada um e que compartilhem as definições e ações aplicadas a estes casos.

É necessário o envolvimento e a participação de todos que suspeitarem: família, vizinhos, amigos, parentes, escola e uma articulação eficiente entre as diferentes áreas de atuação, para dar conta das múltiplas e complexas demandas presentes nestes casos.

A prevenção da violência sexual é possível nas famílias através do diálogo claro e objetivo a respeito de sexualidade e dos limites pessoais, pela comunicação aberta e não ameaçadora que dificulte a existência do segredo e pela identificação precoce e intervenção adequada aos casos suspeitos.

Atuando em conjunto, é possível minimizar os danos e proteger as crianças e adolescentes.

Relator:
Théo Lerner
Médico Ginecologista
Membro do Núcleo de Estudos da Violência Contra a Criança e o Adolescente e Membro Honorário da Sociedade de Pediatria de São Paulo